ENTRE O PRAZER E O SIGNIFICADO

sexta-feira, maio 2

Homo Faber 21

Augusto Peixoto

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'Há um momento em que toda a vida se leva ao ombro. Temos 20 anos, mudamos a cada estação, sentamo-nos num caixote de fruta, empilhamos os livros, amanhã podemos ir viver para Uruk ou Bucareste, mesmo quando só vamos ali dar uma volta.

E quando esse momento passa temos 30 anos, 30 mil contos de empréstimo a 30 anos, talvez não 30 mil livros mas três mil, talvez não livros mas discos, pedras, moedas, perdemos a cabeça num antiquário, mobilámo-nos no IKEA, trouxemos um kilim de Marrocos e passámos aquela semana a pintar a parede de azul petróleo, aquela semana a assentar o chão flutuante, e ele há tantas maneiras de compor uma estante (...).

Um livro põe a cabeça em movimento, uma biblioteca faz-se na cabeça. Se eu partisse agora, quais dos meus livros iriam comigo? Começamos como devíamos acabar, nenhuma renda, nenhuma dependência.

Nas cidades grandes há quilómetros quadrados de armazéns cheios de estofos de veludo bege, mesas-de-cabeceira, listas de casamento, motivos de divórcio. Uma casa são toneladas de objectos a que chamamos a nossa vida de cada vez que voltamos do mundo e nos aninhamos para esquecer. Depois há um momento em que encontramos alguém que parte e algo em nós pergunta como foi que aconteceu não podermos partir amanhã, e não podemos mesmo porque toda a nossa vida está aqui. Mas a vida verdadeira, nosso inferno, nossa salvação, nunca está aqui nem ali e isso é infinitamente portátil, vai para onde formos.
Tudo o que aprendi foi a não furar as paredes.'
Alexandra Lucas Coelho ( no Público de hoje)

4 comentários:

margarida disse...

Li no jornal, reli aqui. Sublinhei mais. Mas o que importa isso quando a mensagem é grande e há quem a divulgue?
Sorrisos e sol, muito sol.

Palhaço Voador disse...

Li no jornal, enquanto ouvia Dead Combo. Tão longe...tão perto...debaixo do mesmo sol :o)

Palhaço Voador disse...

Li no jornal, enquanto ouvia Dead Combo. Tão longe...tão perto...debaixo do mesmo sol :o)

margarida disse...

:)
E que bom que é ouvir Dead Combo, ler o jornal, viver um dia de sol e, depois disto tudo, conseguir também voar.

‘Ever tried. Ever failed. No matter. Try Again. Fail again. Fail better.’

‘Ever tried. Ever failed. No matter. Try Again. Fail again. Fail better.’