Uma professora da creche observava as crianças da sua turma a desenhar.
Ia passeando pela sala para ver os trabalhos de cada criança. Quando chegou ao pé de uma menina que trabalhava intensamente, perguntou-lhe o que estava a desenhar. A menina respondeu: - 'Estou a desenhar Deus.' A professora parou e disse: - 'Mas ninguém sabe como é Deus.' Sem piscar e sem levantar os olhos do seu desenho, a menina respondeu: - 'Saberão dentro de um minuto'.
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.Foto de Dinko Mitev
domingo, setembro 27
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JORGE VASQUES (1958 - 2009)
Aplaudimos um actor, vamos para casa e no dia seguinte recebemos incrédulos a notícia da sua morte logo após o espectáculo. É desconcertante.
'Se a nossa primeira prioridade é conseguir controlar o poder do ego, então a humildade é a primeira disciplina para o fazer. Para cada um de nós, existe uma linha contínua de ego. Numa das extremidades dessa linha, temos o ego insuficiente, na outra, ego em excesso. A humildade é o equilíbrio entre os dois extremos.
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Para a maioria das pessoas, a tradição mostra que o oposto do ego excessivo é a humildade, quando, de facto, ter ego insuficiente é tão perigoso e contraproducente como tê-lo em excesso.
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A verdadeira humildade é auto-estima inteligente que nos impede de termos uma ideia excessivamente boa ou má a respeito de nós próprios. Lembra-nos quão longe chegámos e, ao mesmo tempo, ajuda-nos a ver quão longe estamos daquilo que podemos ser.
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A humildade não é uma dicotomia, é uma dualidade. Como tal, a humildade tem a capacidade de dizer "sou alguma coisa" e "não sou nada" - ao mesmo tempo. Sinto-me realizado e, ao mesmo tempo, incompleto; talentoso e mediano; especial e não melhor do que qualquer outro; extraordinário e comum; popular e desconhecido; merecedor de respeito e não mais merecedor do que qualquer outra pessoa. F. Scott Fitzgerald disse "O teste para uma inteligência de primeira categoria é a capacidade de ter em mente duas ideias opostas ao mesmo tempo, e ainda manter a capacidade de funcionar."
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Aliar a busca de aceitação social à humildade não é fácil, pois quando somos humildes, gostem ou não de nós, sentimo-nos confortáveis. A exibição de brilhantismo não pode ocupar os pensamentos de alguém que reconhece o seu brilhantismo e que, ainda assim, compreende que não é o único ser brilhante no planeta, ou mesmo na sala. A dualidade não apaga a nossa identidade, simplesmente equilibra e exalta as características que já temos.
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A humildade não é o arquitecto das personalidades mais simples. É o engenheiro das personalidades mais fortes.'
'Casa purificada, paisagem em construção. Múltiplos troncos, pequenos e grandes – alguns tão grandes que é possível viver toda uma vida lá em cima (...), o chilreio de pássaros que se deixa conduzir pelo sopro das mulheres, movimentos rápidos denunciam a entrada das estações, à neve sucede-se o sol e a ceifa...
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Numerosas medas de palha desenham uma dança colectiva, animada por foices imaginárias, e que em alguns momentos também é uma instalação; noutra cena, dois irmãos disputam o controlo de uma árvore num exercício rigoroso que tem vestígios de capoeira. Várias outras técnicas marcam presença de forma estilizada, como o trapézio, dançado num baloiço por dois adolescentes, numa cena trasbordante de ternura. De cântaros à cabeça, a austera peregrinação de velas torna-se uma prova de concentração (...).
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A gramática de movimentos é exímia e de uma riqueza assinalável: noutros momentos – a cena dos pássaros – esses mesmos corpos são dúcteis e esvoaçantes, leves e harmoniosos. Na poderosa cena do “homem-estendal”, os movimentos são torcidos e quebrados, para logo depois se tornarem elásticos, insinuantes, no quadro de sedução das mulheres que enfeitiçam os homens e os apanham nos fios da sua teia.
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Cantorias, um concerto impromptu, brindes à volta do garrafão, alguém que se engasga... Por esta altura, já os intérpretes estão completamente enlameados, numa mistura de terra, sal, palha e aguardente. Ainda vão desejar e conhecer mais água, porque a última dança acontece no mar, descoberto por alçapões de fantasia. E, depois da aguada, o devaneio continua, porque o signo é o da viagem e a casa é navegante. A água, em silêncio, embala os viandantes.'
'(...) Míchkin é idiota aos olhos dos seus congéneres, já que, no plano da realidade superior, ele possui a mais elevada inteligência que é a do coração. Dotado de um grau supremo de bondade, de pureza, de intuição, ele penetra as almas e o seu sofrimento; só o sofrimento possui segundo ele, a virtude purificadora. Míchkin faz nascer a confiança; as pessoas que com ele entram em contacto desatam a sentir e falar a verdade.
(...) É de uma humildade absoluta, a ponto de ser impossível humilhá-lo, a ponto de ser confuso exprimir ideias elevadas, por temor de o comprometer perante a sua própria pessoa. Qualquer ser lhe parece mais precioso do que ele mesmo. Não ignora que toda a gente se debate com "pensamentos duplos", embora ele só conceba pensamentos unos. É talvez a única personagem dostoievskiana sobre a qual "o diabo" não tem mão e cuja pureza é integral e inatacável.'
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Nina Gourfinkel, Programa TNSJ
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'(...) Nekrosius, não obstante o rigor das suas encenações, pensa com o coração. É isso que tem insinuado em entrevistas, é isso que confirma Tauras Cizas ao telefone: "quando ensaiamos uma cena ou um acto, ele não vê com os olhos mas acima de tudo com o coração. Se algo lhe parecer demasiado inteligente, não serve." Ele procura o emocional.'
'A vida é um incêndio: nela dançamos salamandras mágicas. Que importa restarem cinzas se a chama foi bela e alta? No meio dos toros que desabam, cantemos a canção das chamas! Cantemos a canção da vida, na própria luz consumida.'